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Breve Reflexão Sobre a Vinda do Senhor e a Esperança Humana

Breve Reflexão Sobre a Relação Entre a Vinda de Cristo e a Esperança Humana

Texto: I Tessalonicenses 4.13-18

Por Alexandre Azevedo

O contexto histórico da passagem bíblica na qual se baseia esta reflexão está relacionado à angústia da igreja em Tessalônica em face a uma dúvida relativa aos eventos relacionados à volta de Cristo. Sua maior alegria estava dando lugar à sua maior preocupação. Esperavam confiantemente pelo Senhor, mas estavam inseguros e temerosos de que, de alguma forma, aqueles que estavam morrendo sem alcançar a Sua vinda (parousia) fossem prejudicados.

As palavras de Paulo serviram para tranquilizar aqueles irmãos, na medida em que esclareceu a ordem dos acontecimentos relativos à Igreja, ligados à parousia: em primeiro lugar, os mortos em Cristo ressuscitarão; em seguida, todos os crentes, de todas as épocas, subirão juntos, a encontrar (recepcionar) o Senhor nos ares. Este evento inaugurará o estado eterno da Igreja ([…] e assim, estaremos para sempre com o Senhor – v. 17b).

Com base nisto, gostaria de destacar três fatos depreendidos do texto. O primeiro nos dá conta de que o sentido da existência humana não encontra seu fundamento nas experiências transitórias da temporalidade. Em outras palavras, nossa existência não pode ser justificada pelo curto espaço de tempo durante o qual nos relacionamos com este mundo. Paulo expõe isto na medida em que estabelece um paradoxo irreconciliável entre a esperança cristã e a falta de esperança do mundo quanto ao porvir. De modo diferente dos descrentes (daqueles que não têm esperança), podemos nos alegrar, pois temos a garantia de que estaremos para sempre com Cristo, e é isto que dá sentido à nossa existência.

O segundo fato diz respeito ao conteúdo de nossa crença com relação à parousia. Compreendê-la parcialmente é colocar-se aquém da poderosa expectativa que ela deve gerar em nosso coração. O resultado da má compreensão pode ser sentimentos que vão desde a instabilidade emocional (no caso dos tessalonicenses, a preocupação e a tristeza pelos que haviam morrido sem alcançar a promessa) à total apatia espiritual (como nos nossos dias, por parte de muitos).

O terceiro fato diz respeito à historicidade da parousia e dos eventos a ela relacionados. Para Paulo, a vinda de Jesus não é um ideal utópico, uma dramatização alegórica com vistas à mobilização dos esforços cristãos para o estabelecimento do Reino de Deus, através da transformação da sociedade. Ao contrário, ele sabe que Jesus voltará na história, visível e corporalmente, para receber sua Igreja para si mesmo. Por ocasião de Sua vinda haverá ressurreição de mortos e a Igreja irá ao Seu encontro nos ares. Por mais fantástico que possa parecer, é história a se cumprir.

Negar o caráter histórico da parousia e do arrebatamento da Igreja é relativizar o próprio núcleo da escatologia do Novo Testamento. Além disto, a falta de percepção do significado da volta de Jesus e do arrebatamento pode deslocar o centro de nossas expectativas do porvir para este mundo, gerando em nós a ilusão de que o paraíso aqui se conquista e de que nada mais precisamos, além da felicidade nesta vida. Neste contexto, o próprio conceito de urgência missionária é esvaziado e a pregação deixa de ser conclamação ao arrependimento e à fé, e passa a ser discurso de conveniência ou mera conclamação ao engajamento pelas causas sociais.

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Ser e Não-Ser: Uma Reflexão Sobre a Existência de Deus

Ser e Não-Ser: Uma Reflexão Sobre a Existência de Deus

Por Alexandre Azevedo

Existir é ser: oposto do nada. O nada, por definição, é ausência absoluta, é o não-ser. Assim, o que não é o nada é existência, independente do nível, independente da forma. O ser integra a realidade, e não “é” fora dela. Então, característica do ser: ser percebido, por si ou por outros.

A percepção do ser por si mesmo ou por outros denota sua existência objetiva. Logo, o não-ser não pode, por definição, ser percebido, e se algo é percebido não é um não-ser, logo existe. Isto não significa que todas as sensações interiores, tidas como percepções, apontam para a realidade. Há de se admitir a conclusão de Descartes de que a percepção dos objetos sensíveis não está livre de enganos, o que significa que o conhecimento empírico (da experiência) em si não nos dá total garantia acerca da realidade. No entanto, isto não inviabiliza a proposição de que a existência do ser é atestada por sua autopercepção ou pela percepção de outros, pois ainda que o julgamento dos dados relativos a um objeto do conhecimento (um ser), dados estes fornecidos pelos sentidos à razão, possa estar equivocado, não se pode duvidar da existência de tal objeto, pois a mesma não está atrelada ao tipo de julgamento que dela se faz. Desta forma, ainda que se julgue mal um ser percebido, não se pode duvidar de que a simples percepção do mesmo confirma a sua existência.

Isso é verdade para todas as categorias de existência. A Bíblia nos fala de duas principais: existência necessária e existência derivada. A existência necessária é a existência “em si e por si”, e pertence exclusivamente ao Ser necessário (Deus). A existência derivada é a existência recebida e não é em “si mesma”, pois depende de outro ser que a origine. É, portanto, a categoria de existência de todos os outros seres que não o Ser necessário. A existência necessária não tem um marco inicial, pois uma vez que não é derivada de outro, e nem pode ter-se originado do nada (pois do nada, nada vem), só pode ser eterna. Por sua vez, a existência derivada ou recebida tem um início, portanto não é eterna, sendo, por isso, limitada.

A Bíblia apresenta Deus como um Ser cuja existência está em Si mesmo, sendo que esta abarca a totalidade do tempo histórico (passado, presente e futuro) e o ultrapassa, pois nessa relação Ser & tempo, o Ser é anterior ao tempo. Isto fica evidente pela resposta de Deus a Moisés, quando este lhe perguntou acerca do Seu nome: “Eu Sou o que Sou” (Êxodo 3:14). Tal afirmação evoca a ideia de independência absoluta e de total autosuficiência, inclusive com relação ao tempo.

Sendo Deus, portanto, um Ser, Sua existência, necessariamente, deve ser percebida. O testemunho bíblico acerca disto nos dá conta de que Deus não apenas tem plena consciência de Si mesmo – autopercepção (cf. o versículo acima mencionado), mas também se torna evidente na mente de suas criaturas. É o que diz Romanos 1:19-21: ”Porquanto o que de Deus se pode conhecer neles se manifesta, porque Deus lho manifestou. Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se veem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis; Porquanto, tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças, antes em seus discursos se desvaneceram, e o seu coração insensato se obscureceu”.

O fato de que a existência de Deus é percebida por suas criaturas é atestado pela universalidade da ideia da divindade. Apesar de não haver uma unanimidade na definição desta, sabe-se, de forma geral, da existência do Ser Superior, muito embora tal ideia seja, às vezes, diluída na concepção de múltiplas divindades (como no politeísmo), ou na universalização do conceito de Deus (como no panteísmo), mas aqui deve-se considerar o que foi dito acima, ou seja, que apesar da possibilidade de se julgar mal um ser percebido, não se pode duvidar de que a simples percepção do mesmo confirma a sua existência. Assim, não é a forma como se entende este ser, mas a conclusão de que o percebê-lo atesta a sua existência.

Portanto, se tem-se consciência da ideia de Deus, e se esta é corroborada pelos fatos externos, que fazem eco na interioridade, então Deus existe, pois o não existente, o não-ser, o nada não poderia desencadear tal processo, por uma impossibilidade lógica.